Saturday, December 03, 2005

Esse bilhão é meu!



A USAID, agência de ajuda ao desenvolvimento internacional do governo americano, publicou um edital no dia 30 de novembro oferecendo entre 1 e 1,3 bilhão de dólares a “qualquer entidade” que apresente um “programa de estabilização econômica e social de dez Cidades Estratégicas identificadas pelo Governo dos Estados Unidos como críticas para a derrota da Insurreição no Iraque. O número de Cidades Estratégicas pode se expandir ou se contrair ao longo do tempo”. O programa terá duração de dois anos, prorrogável por mais um ano, e as propostas serão aceitas até 31 de janeiro de 2006.
O edital foi publicado na moita num site do governo federal.
O blog de Arianna Huffington, Huffington Post, foi o primeiro a descobrir o edital. No sábado, o New York Times publicou um editorial a respeito, debochando desse programa, especialmente porque ele coincide com o anúncio pelo presidente Bush de mais um “plano para a vitória” no Iraque, recebido com total descrédito. No mesmo jornal, a colunista Maureen Dowd chama o plano de Bush de mera propaganda e sugere que a própria Casa Branca apresente esse plano à USAID para se candidatar ao programa de 1 bilhão de dólares.
A oferta está aberta a qualquer um e, como observa o editorial do Times, “experiência prévia não é necessária”. Portanto, vou apresentar à USAID meu próprio plano. Esse bilhão já está no papo!
As Cidades Estratégicas no Iraque ainda não estão identificadas. Mas não faz diferença. Meu plano é tão bom que se aplica a qualquer cidade iraquiana, mesmo que o número das que são estratégicas se expanda ou se contraia ao longo do tempo.



1) Ampliar o projeto já iniciado pelo Pentágono, de colocar notícias falsas nos jornais iraquianos, com manchetes otimistas, projeto a cargo de uma empresa chamada Lincoln Group e que foi revelado pelo Times no dia 1/12. As matérias já publicadas incluem títulos como “As areias sopram na direção de um Iraque democrático”, e “Combatentes da Al Qaeda rastejam como cães”. Dentro do programa para estabilizar as Cidades Estratégicas, os iraquianos seriam constantemente bombardeados com boas manchetes e ótimas notícias no rádio e na TV. O colunista John Tierney do Times sugere:
“Orgias de Osama: as fitas que a Al Jazeera não mostra”, “Alegria no Blecaute: 101 coisas divertidas para fazer quando falta luz” e “Suicida informa do Além: não há virgens”.
Nessa linha, eu acrescentaria:
“Tudo azul pra lá de Bagdá”, “Alá manda água pra iaiá”, “Alá manda água pra ioiô”, “Alá, meu bom Alá, obrigado por nos mandar o Bush”.
Para completar, construir em Bagdá um imenso túnel com forte iluminação numa das extremidades para que ninguém mais possa dizer que não há luz no fim do túnel.



2) Construção de um Ramadódromo em cada Cidade Estratégica para procissões religiosas durante o Ramadã e fora dele, promovendo o congraçamento das seitas sunita e xiita. Os iraquianos criariam suas Escolas de Sangue para desfilar diante de um júri formado por celebridades de Holywood, num show transmitido via satélite para todo o mundo. Seriam premiadas categorias como: Ala dos Flagelantes, Comissão de Sheiks (formada só por sheiks que embolsam comissão), Ala das 72 Virgens, Adereços Explosivos, Carros Alegóricos Bomba.

Comissão de Sheiks

3) Explorar a paixão do povo iraquiano pelo futebol, importando jogadores, técnicos e juízes brasileiros, afastados por fraudarem o resultado dos jogos. Isso garantiria sempre a vitória do time de casa em cada Cidade Estratégica, para a alegria da população. No campeonato nacional, o Iraquianão, todos os times das Cidades Estratégicas empatariam em primeiro lugar, cada um recebendo a taça Libertadores das Areias. Para estabilizar o país, a seleção nacional iraquiana ganharia a Copa do Mundo honorária na Alemanha, não precisando nem jogar.

seleção iraquiana

4) Distribuição de virgens. Já que a principal arma de recrutamento da Al Qaeda é a promessa de 72 virgens no Além, o governo iraquiano com o apoio do Pentágono esvaziaria essa tática terrorista, oferecendo virgens aos insurgentes ainda em vida. Este projeto permitiria à USAID ao mesmo tempo ajudar os países com excesso de virgens, como o Brasil e a Rússia, a escoar seus excedentes. Para garantir a permanência dos ex-terroristas no programa de estabilização, as 72 virgens seriam entregues a prazo, uma por mês, o que obrigaria o beneficiário a permanecer fiel à causa bushista durante seis anos. O programa teria como subproduto a redução do desemprego, já que o ex-militante poderia abrir um bordel com suas ex-virgens, propiciando uma nova fonte de renda.



5) Introdução do plano brasileiro de racionamento de energia. Em vez do atual caos de blecautes imprevisíveis nas piores horas, os iraquianos se submeteriam alegremente ao plano brasileiro de blecautes programados nas piores horas. A introdução do aparelho para monitorar o uso de eletricidade em cada residência criaria a ilusão de que um dia haverá eletricidade. Enquanto a luz não vem, aconselha-se ampla distribuição de velas e lamparinas.



6) Importação de milhões de jegues do Nordeste brasileiro. Já que falta gasolina no Iraque, embora o país possua a segunda maior reserva mundial de petróleo, a importação de jegues para puxar os veículos resolveria o problema. Sugere-se o treinamento prévio dos animais por instrutores do exército americano, para evitar a introdução do jegue-bomba.

carro movido a jegue estacionado em Bagdá

7) Libertar Saddam Hussein e pagar a ele bilhões de dólares – fora do pagamento por este programa, claro – para voltar à presidência como um fantoche dos americanos. Assim, a existência de centros de tortura, abusos de presos, assassinato de civis, roubo de dinheiro público, tudo o que tem sido documentado no Iraque, deixaria de ser atribuído às forças de ocupação e seus asseclas. Seria tudo, mais uma vez, culpa de Saddam.



8) Retirar os 150 mil militares americanos, e os gatos pingados britânicos e de outras nações, que ocupam o Iraque. O Iraque voltaria a ser uma nação soberana e independente, embora arruinada.

9) Levar a julgamento no tribunal de Haia, por crimes de guerra, George W. Bush, Richard Cheney e Donald Rumsfeld, mais todos os seus subordinados que comandaram a invasão do Iraque.

10) Pedir perdão a Alá por ter usado seu santo nome em vão e rezar para este plano dar certo.

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