Friday, July 08, 2005

Baudelaire e as drogas

Baudelaire, autoretrato sob o efeito do haxixe

Os Paraísos Artificiais de Baudelaire é o melhor estudo que eu conheço sobre o efeito moral e espiritual das drogas, seja o álcool ou os derivados do ópio e da maconha. É a mais profunda e convincente argumentação contra o uso de drogas, escrita há 145 anos por alguém que sabia do que estava falando. Baudelaire usou haxixe quando jovem e tornou-se dependente de um derivado de ópio, o láudano, que usava para aliviar as dores da sífilis. Os trechos que seguem são da conclusão da primeira parte, O Poema do Haxixe.

Aquele que recorre a um veneno para pensar em breve não poderá pensar sem veneno. Dá para imaginar o destino horrível de um homem cuja imaginação paralisada não funciona mais sem o haxixe ou o ópio?

(...) Mas o homem não está tão abandonado, tão privado de meios honestos de ganhar o céu, a ponto de ser obrigado a invocar a farmácia e a feitiçaria; não precisa vender a alma para comprar o paraíso. Que paraíso é esse, comprado ao preço da salvação eterna?

(...) Nós, poetas e filósofos, regeneramos nossa alma pelo trabalho e a contemplação. Pelo exercício assíduo da vontade e a nobreza permanente da intenção, criamos para nosso uso um jardim de verdadeira beleza. Confiantes na palavra de que a fé remove montanhas, realizamos o único milagre que Deus nos concedeu.


Baudelaire

Baudelaire conta uma historinha curiosa sobre Balzac:

Balzac pensava que não há para o homem maior vergonha nem sofrimento mais intenso do que abdicar da vontade. Eu o vi uma vez, numa reunião onde se falava dos efeitos prodigiosos do haxixe. Ele ouvia e questionava com uma atenção e uma vivacidade divertidas. As pessoas que o conheceram sabem que ele deveria estar interessado. Mas a idéia de não controlar seu pensamento o chocava intensamente. Ofeceram-lhe dawamesk (pasta de haxixe); ele examinou, cheirou e devolveu sem provar. A luta entre sua curiosidade quase infantil e sua repugnância pela abdicação era visível no rosto expressivo, de maneira notável. O amor da dignidade venceu. De fato é difícil imaginar o teórico da vontade consentindo em perder uma parcela dessa preciosa substância.

Honoré de Balzac

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